Em São Paulo, durante durante muitos anos, a Cracolândia se concentrou na região do entorno da praça Júlio Prestes, quem passava por ali, testemunhava os paradigmas do consumo de crack e a ineficácia das políticas públicas de combate às drogas.
No coração da cidade mais rica da América Latina, em busca de nutrir a dependência, usuários se concentravam em grandes contingentes para usar o crack. Um profundo dilema social por anos se arrasta sem que consiga de fato ser resolvido.
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Todas as tentativas de acabar com a Cracolândia foram frustradas, em sua maioria, pautadas na truculência de ações de segurança pública. Porém, há quase um mês, na passagem da noite do dia 18 de março para a madrugada e manhã do dia 19, a cidade amanheceu sem nenhum usuário de crack na região.
O problema foi de fato resolvido? As políticas de combate às drogas foram vitoriosas? O que ocorreu para que os usuários deixassem o local? Teria São Paulo definitivamente vencido a Cracolândia?
Perdidos, comerciantes, moradores locais, trabalhadores, profissionais de segurança, saúde, assistência, religiosos, outros atores sociais se perguntavam sobre o que teria ocorrido e para onde teriam ido os usuários?
Antes que os leitores otimistas pensem que o problema foi resolvido por força de políticas públicas, antecipo que foi uma ação do Primeiro Comando da Capital (PCC) que determinou a transferência da Cracolândia da praça Júlio Prestes para a praça Princesa Isabel, apenas 500 metros de distância.
Isso mesmo, o problema não foi resolvido, apenas transferido de local e quem conseguiu realizar com êxito, sem barulho, violência, bombas, pirotecnia e cobertura midiática foi o PCC e não o Estado.
O PCC tem o monopólio da distribuição do crack e outras drogas na Cracolândia, no estado de São Paulo e em todo o país, e também concentra boa parte da exportação para diversos mercados do mundo.
Por razão estratégica os traficantes que atuam na Cracolândia determinaram um ‘Salve’, espécie de ordem para ser imediatamente cumprida, e em uma noite como tantas outras no centro de São Paulo, sem que ninguém percebesse, os usuários mudaram de lugar, assim como a venda e distribuição.
Moradores da região do entorno da praça Júlio Prestes ficaram satisfeitos com a ação, pois conseguem pedir carros por aplicativos, receber cartas, andar nas ruas e receber amigos e familiares nas ruas que compunham a antiga Cracolândia, porém, longe de resolver o problema, ele foi apenas transferido de lugar, desse modo, o PCC mantém seu monopólio da venda das drogas e ainda soma alguns pontos por ter conseguido realizar um feito que política pública alguma conseguiu.
Esse é apenas um paradigma do debate sobre as drogas, discutir tal tema, pressupõe, entre outras coisas, compreender as complexidades envolvidas, a atuação de atores diversos e os interesses em jogo.
Para quem por anos não conseguia caminhar na praça Júlio Prestes, pode pensar que o problema foi resolvido, porém, se andar por mais 500 metros, verá que o contingente de usuários da Cracolândia apenas migrou de local, mas, é piada pronta esperar que o PCC resolva o problema das drogas na Cracolândia ou no Brasil, porém é sensato compreender que quando os usuários afetam seus lucros, ou quando por interesses estratégicos os postos de venda são questionados, as Cracolândias podem naturalmente mudar de endereço, confundindo a atuação da política pública.
Fica a dúvida de como as políticas públicas de combate às drogas atuarão no novo endereço e como vão encarar o fato de que quem de fato controla é o PCC e não o Estado.
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(Este texto não reflete, necessariamente, a opinião de HojeDiario.com)