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“Carne, cerveja e comunismo”, por Marcelo Candido

Ele gostava muito de um bom churrasco e sempre convidava os amigos à sua casa, desde que levassem cerveja. Mas a carne, como gostava de repetir, era sempre por sua conta. “Mi casa, su casa” era outro mantra que dizia a cada pessoa que chegava ao rega-bofe trazendo sua latinha, porém sempre deixava claro que não fazia muita ideia do que isso significava, embora achasse a frase bonita e acolhedora.

Política era, para ele, um assunto chato pra caramba! Toda vez que o assunto rolava, fazia questão de dizer que festa boa era festa sem discussão política. Aliás, adorava dizer que sua vida era simples e não dependia de nenhum político imoral para viver, ou seja, ele dava conta de sua vida e o resto que se danasse. Em 2018 os churrascos foram se transformando em grandes comícios eleitorais, mesmo que ele não gostasse. No entanto, no calor daquele ano, até aquele simples cidadão passou a dar seus pitacos nas conversas regadas a carne e a álcool. Dizia que escolher alguém de fora da política era melhor, porque o Brasil estava cansado de políticos profissionais.

Em uma dessas ocasiões, um amigo perguntou se ele contrataria um mecânico não profissional para revisar o motor de seu carro antes de ir à praia. Ele respondeu que era claro que não, jamais colocaria nas mãos de um amador os cuidados para com seu carro, que, inclusive, transportava toda a família quando iam ao litoral. Ficou meio pensativo quando o amigo disse que votar em políticos não profissionais daria errado na certa, pois as complexidades de um país exigem políticos honestos e experientes, ou seja, profissionais. Mesmo assim, votou em quem achava que tiraria os comunistas do comando da nação, na certeza de que tudo melhoraria. Ele nunca soube, entretanto, o que era esse negócio de comunista! Mas uma certeza ele tinha. Eram eles, os comunistas, que atrasavam o Brasil.

Anos depois, já recuperado da Covid-19, mas carregando várias sequelas, além da tristeza de ter perdido muitos amigos durante a pandemia, ele, cabisbaixo, respondeu a um amigo que perguntou quando as festas voltariam a acontecer que não faria mais os churrascos, porque o preço da carne estava na hora da morte e, sem os amigos de outrora, não se sentia bem em voltar. Inconformado, disse ainda que não tinha coragem de pedir aos amigos que levassem cerveja, pois esta também estava com os preços nas alturas. Após um longo suspiro, confessou: saudades do tempo em que os comunistas governavam o Brasil…

(Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do HojeDiário.com)